EXMO. JUIZ DO TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL DO CEARÁ
PROCESSO
Nº 426-71.2012.6.06.0048
RECORRENTE: DANIELA HELENA DE SOUSA
MELO
LUIS
ACÁCIO DE SOUSA
RECORRIDOS: GONÇALO SOUTO DIOGO
CARLOS SÉRGIO
DE BRITO
PARECER
Nº 17747/2013
Recurso Eleitoral. Ação de Investigação Judicial
Eleitoral - AIJE. Captação ilícita de sufrágio. Art. 41-A, lei 9.504/97. Frágil
acervo probatório. Pela manutenção da sentença.
O Ministério Público Eleitoral, pelo
Procurador Regional Eleitoral, comparece ante Vossa Excelência para apresentar PARECER
nos autos do processo em epígrafe, o que faz com base nas razões de fato e de
direito a seguir expostas:
1. SINOPSE FÁTICA
1.1. Trata-se de Recurso
Eleitoral interposto por Daniela Helena de
Sousa Melo e Luis Acácio de Sousa em virtude da insatisfação com a decisão
prolatada pelo Juízo Eleitoral da 48ª Zona (Nova Russas/CE), o qual julgou
improcedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral por antever um conjunto
probatório inidôneo para servir de sustentação de decreto condenatório
proferido nos termos do art. 41-A da Lei nº 9.504/97.
1.2. Os recorrentes sustentam a viabilidade jurídica da reforma da
decisão, uma vez que o lastro probatório dos autos autorizaria indubitavelmente
a subsunção dos fatos expostos na inicial à previsão de captação ilícita de
sufrágio.
1.3. Nas contrarrazões, os recorridos pugnam pela
manutenção da decisão. No mérito, sustentam a falta de prova a ensejar
procedência da ação, ilegalidade da gravação clandestina como meio de prova,
aplicação da teoria da “árvore dos frutos envenenados” e ausência dos
requisitos de comprovação da captação ilícita de sufrágio.
1.4. É o
relatório. Vieram os autos com vista ao Ministério Público Eleitoral. Passo a
me manifestar.
2. RAZÕES DE DIREITO
2.1. DO CABIMENTO DO RECURSO
2.1.1. A princípio, verifica-se a tempestividade das
apresentações dos apelos, uma vez que apresentados no tríduo legal, já que os
recorrentes foram intimados da sentença em 31/07/2013 (fl. 220-verso), tendo o
recurso sido interposto em 05/08/2013 (fl. 222), razão pela qual merecem
conhecimento os apelos interpostos.
2.2. DO MÉRITO
2.2.1. Conforme a exordial, Gonçalo Souto Diogo e
Luiz Acácio de Sousa, eleitos no pleito de 2012 aos cargos de prefeito e
vice-prefeito em Nova Russas/CE, teriam realizado captação ilícita de sufrágio,
diretamente ou através de representantes, mediante o pagamento de valores aos
eleitores com o escopo de que estes viessem a votar nos demandados ou, ao
menos, deixassem de votar nos adversários políticos, bem como asseveram que
houve a distribuição “gratuita” ou venda de bebidas alcoólicas a preços
irrisórios durante eventos patrocinados pelos investigados.
2.2.2. As provas colimadas aos autos pelos
demandantes, às fls. 02/44, foram exaustivamente analisadas ao longo de todo o
trâmite processual, tais como lista de eleitores (fls.33/34), degravações (fls.
35/43) e mídia em CD-Rom (fl.44), o qual consta gravações em áudio e vídeo
realizadas por diferentes interlocutores.
2.2.3. Discutiu-se sobre
a licitude das mencionadas gravações. Sobre o tema, importa trazer a lume o
posicionamento de Alexandre Cebrian Araújo Reis e Victor Eduardo Rios
Gonçalves, na obra “Direito Processual Penal Esquematizado”, o qual
lecionam:
(...)b) Gravação de conversa, telefônica ou ambiental,
por um dos interlocutores, sem conhecimento do outro: prova válida. Nesse
sentido: “1. A gravação ambiental meramente clandestina, realizada por um dos
interlocutores, não se confunde com a interceptação, objeto cláusula
constitucional de reserva de jurisdição. 2. É lícita a prova consistente em
gravação de conversa telefônica realizada por um dos interlocutores, sem
conhecimento do outro, se não há causa legal específica de sigilo nem de reserva
da conversação. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido” (AI 560.223
AgR/SP — 2ª Turma — Rel. Min. Joaquim Barbosa — DJe -79— 29.04.2011).
2.2.4. Sem a pretensão de esgotar o tema atinente a
licitude ou validade das referidas provas, constata-se haver fundamento
jurisprudencial e doutrinário para sustentar a legalidade de “gravação de
conversa telefônica realizada por um dos interlocutores, sem conhecimento do
outro, se não há causa legal específica de sigilo nem de reserva da
conversação”.
2.2.5. Por outro lado, mesmo se admitindo a
viabilidade das referidas provas, importa consignar que as mencionadas
gravações não se mostraram suficientes a comprovar a participação ou
envolvimento dos promovidos em qualquer das tentativas de captação ilícita de
sufrágio cometidas, tendo as ofertas sido realizadas por intermediários, os
quais não foi demonstrado o vínculo destes com o prefeito e vice-prefeito
eleitos em Nova Russas/CE em 2012.
2.2.6. Em sede judicial, foram ouvidas as
testemunhas da parte autora Adrianízio Paulo de Oliveira Alves, Iraneide Alves
da Fonseca, Geová de Souza e Francisco de Assis da Silva Camelo (ouvido como
declarante). Da parte promovida, foi realizada a oitiva de Antônio Mendes de
Sousa e Joselena Soares do Nascimento.
2.2.7. Dos testemunhos colhidos, destaca-se as
informações prestadas por Geová de Souza Abreu, o qual asseverou:
No início as notícias davam contas de que lá
estavam sendo distribuídas bebidas. Denunciaram estes fatos as autoridades que
ao chegarem lá obtiveram a informação que na verdade, a cerveja era vendida a
um real. Não viu ninguém pagando qualquer importância pela cerveja. O
próprio depoente tomou 03cervejas antárcticas, que pegou gratuitamente com os
militantes de campanha. Que apenas ouviu comentário de rua sobre a compra
de votos, porém não viu isto acontecendo. Que não viu as autoridades no local
do comício. Soube que tinham ido por volta de seis horas. Que não conhece as
pessoas que estavam fazendo as distribuições, mas afora a cerveja, viu vodka,
marca Orloff.
2.2.8. Verifica-se que Geová de Souza Abreu afirma
expressamente ter recebido 03 (três) cervejas gratuitamente e que não viu
ninguém pagando pelas referidas bebidas.
2.2.9. Não obstante a citada testemunha tenha
confirmado em juízo o recebimento das aludidas cervejas sem que fosse preciso
desembolsar qualquer quantia, novamente não se comprovou o conhecimento ou
anuência dos promovidos, ou mesmo qualquer pedido ou promessa de votos ainda
que implicitamente. Diga-se mais, não se sabe nem mesmo quem foram as pessoas
que ofereceram gratuitamente as referidas cervejas, nem foi delineado
nominalmente nenhum outro eleitor que tenha recebido gratuitamente.
2.2.10. Urge também transcrever alguns trechos da
oitiva de Antônio Mendes de Souza, que assumiu a propriedade de algumas das
barracas as quais vendiam cervejas ao preço de R$ 1,00 (um real):
Não foi colocar bebida também a R$ 1,00 no comício
da Daniela por questão de localização, pois queria mesmo era colocar na praça.
Caso o comício dela fosse na praça, teria colocado neste. Chegou a comprar
cervejas de vários preços, de R$ 0,89 e de R$ 0,90, pois, como já disse, não
fez uma única compra, e sim vinha fazendo estoque com compras diferenciadas. Na
verdade, vender a cerveja a R$ 1,00 não dava lucro, porém, como estava
vencendo, preferiu vender a esse preço para não ter prejuízo.
2.2.11. O Tribunal Superior Eleitoral já sedimentou
o entendimento de que para a caracterização da
prática da captação ilícita de sufrágio, disposta no art. 41-A da Lei nº
9.504/97, exige-se prova robusta e inequívoca, vale conferir:
RECURSOS
ORDINÁRIOS. ELEIÇÕES 2010. REPRESENTAÇÃO. DEPUTADO ESTADUAL. CAPTAÇÃO
ILÍCITA DE SUFRÁGIO. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA E INEQUÍVOCA.
RECURSOS ORDINÁRIOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS.
1. A
conveniência, ou não, da reunião dos processos, decorrente de eventual conexão
ou continência - art. 105 do Código de Processo Civil -, é faculdade do juiz,
porquanto cabe a este administrar o iter processual.
2. Na
hipótese, não há conveniência, porquanto os autos supostamente conexos
encontram-se em fases processuais distintas.
3. No
tocante à inexistência de ilicitude quanto à busca e apreensão perpetrada pela
Polícia Federal, constata-se a ausência de interesse recursal, pois o Tribunal
a quo acolheu a referida pretensão nos exatos termos requeridos.
4. O
conjunto fático-probatório - prova testemunhal e material - não é
suficiente à caracterização da prática da captação ilícita de
sufrágio, preconizada no art. 41-A da Lei nº 9.504/97.
5. Recursos
ordinários conhecidos e desprovidos.
(RO nº 151449 – Macapá/AP; Acórdão de 04/06/2013; Relator(a)
Min. LAURITA HILÁRIO VAZ; Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo
149, Data 7/8/2013, Página 200)
RECURSOS
ESPECIAIS. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. ELEIÇÕES 2008. PREFEITO E
VICE-PREFEITO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. ABUSO DO PODER ECONÔMICO. PROVA
ROBUSTA. AUSÊNCIA. APREENSÃO DO MATERIAL INDICATIVO DA PRÁTICA ILÍCITA.
CONSUMAÇÃO DA CONDUTA. NÃO OCORRÊNCIA. RECURSOS PROVIDOS.
1. A
potencialidade lesiva da conduta, necessária em sede de AIME, não foi aferida
pelo Tribunal de origem, não obstante a oposição de embargos de declaração.
2. Nos
termos do art. 249, § 2º, do CPC, a nulidade não será pronunciada nem o ato
processual repetido se possível o julgamento do mérito a favor da parte a quem
aproveite a declaração da nulidade.
3. A
aplicação da penalidade por captação ilícita de sufrágio, dada sua gravidade,
deve assentar-se em provas robustas. Precedentes.
4.
Interrompidos os atos preparatórios de uma possível captação de votos, não há
falar em efetiva consumação da conduta.
5. Recursos
especiais providos.
(REspe nº 958285418 - Santa Quitéria/CE; Acórdão de
04/10/2011; Relator(a) Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA; Publicação:
DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 208, Data 03/11/2011, Página 70)
2.2.12.
Assim, a sentença da 48º Zona Eleitoral – Nova Russas/CE deve ser mantida em
todos seus termos, visto que improcedente por não haver lastro probatório
suficiente de que os demandados praticaram captação ilícita de sufrágio,
consoante o disposto no art. 41-A da lei nº 9.405/97.
3.
CONCLUSÃO
3.1. Por tudo quanto
posto, opina o Ministério Público Eleitoral pelo conhecimento do recurso
interposto por Daniela Helena de Sousa Melo e Luis Acácio de Sousa e,
no mérito, pelo seu improvimento.
Fortaleza-CE, 16 de setembro de 2013.
Marcelo Mesquita Monte
Procurador
Regional Eleitoral Substituto
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